Artigo publicado no Jornal STOP, edição 18
Cláudia B. S. Pacheco,
Extrato do livro A Cura pela Consciência – Teomania e Estresse
É curioso o fato de que nunca encontrei nos melhores dicionários das línguas portuguesa, inglesa e alemã o termo interiorizar. Contudo existe o termo exteriorizar. Aí aparece claramente a intenção do homem de eliminar totalmente a visão de sua vida psíquica projetando tudo de seu interior no ambiente.
O aspecto mais importante do trabalho de Keppe, a chave principal da Trilogia Analítica, é o processo de interiorização. “O homem interiorizado é o homem são.”
Chegamos através da ciência à mesma conclusão de Santo Agostinho e de Sócrates na filosofia. A beleza do corpo do homem, dos seus músculos, cérebro, rosto são reflexos muito apagados da perfeição que existe no interior. A beleza dos animais, da natureza, dos astros, do universo são uma pequena parte da beleza do ser humano. No nosso interior, além da Beleza, existe o Amor, que não existe na realidade externa.
Por mais que tentemos, jamais nossa imaginação poderia atingir as delícias e a satisfação que a Sanidade interna nos traria, se a aceitássemos completamente. A Trilogia Analítica desenvolveu uma técnica de interiorização que propicia este contato. Trata-se da técnica comparativa, onde cada elemento do mundo externo é transportado dialeticamente para o interior do homem. Desta forma, quando colocamos “os outros” dentro da vida psíquica do cliente, ele se acalma, reconhecendo o valor que tem em seu interior, o enorme mundo que tem dentro de si, amenizando a sua inveja.
Se vemos o mal vindo dos outros, também o fazemos com o bem, invejando o que imaginamos não possuir. Mas se o reconhecemos em nós, logo nos acalmamos.
A partir do momento em que o homem (mulher) começa a aceitar essa volta para si, então inicia-se a cura. Quanto mais faz esse movimento, mais se ampliam seus horizontes. O homem muito interiorizado chega a perceber coisas dentro de si que não existem correspondentemente no universo externo, pois o seu íntimo é o que há de mais perfeito em toda a criação.
Se temos essa maravilha em nós, então por que não a usufruímos?
Keppe explica essa recusa por ser o nosso interior o reflexo da beleza divina. A Sanidade que vemos dentro de nós não é nossa realização, e, diante de tanta grandeza e maravilha, cegamo-nos pela terrível inveja que sentimos daquele que nos presenteou com ela. Assim é que a humanidade passou a ver a vida como algo feio, penoso, sem sentido e angustiante, e o “papel” que representamos está longe de ser a expressão da nossa realidade interna. De seres feitos à semelhança de Deus, reduzimo-nos a assassinos, delinquentes, doentes, angustiados.
Keppe notou que a pessoa, quando fala de si mesma na análise, mente ou, na melhor das hipóteses, conta sobre as fantasias que elabora a seu respeito. Mas, quando fala de terceiros, aí sim revela-se, é sincera. Por isso, passou a utilizar somente a técnica comparativa com o fim de obter melhor material para interpretação. O indivíduo precisa de um espelho para poder se ver como é, tanto no mundo físico como no psíquico.
Cada situação, cada fato é interiorizado como um reflexo daquele que fala, e o próprio analista representa a consciência ou o espelho do que se passa no interior do paciente. .Através da técnica dialética ou comparativa, tudo o que o cliente fala retorna ao seu interior: assim a interpretação é baseada essencialmente no material trazido pelo analisado. Deste modo, podemos dar as mais “fortes” interpretações sem criar uma reação de resistência ou hostilidade pessoal contra nós, analistas, o que se chamava de transferência negativa.
Deixamos que o cliente fale bastante sobre nós, para em seguida voltarmos a interpretação para ele — pois na realidade ele falou de si o tempo todo, através de nós. Como exemplo, citamos o caso da cliente R. S., quando falava ao Dr. Keppe a respeito de sua forte oposição à análise e à pessoa dele. O diálogo foi o seguinte:
K — O que a senhora acha de mim?
R — Acho que o senhor fala coisas certas, mas é muito megalômano e se acha o dono da verdade.
K — Então a senhora disse, através de mim que, apesar de saber o que é certo, age de maneira megalômana e se acha a dona da verdade.
Essa é a grande vantagem da técnica dialética: não importa o que a pessoa fale, de quem fale ou se o que diz sobre terceiros é certo ou não, pois tudo o que ela diz durante a sua sessão é sobre si mesma. Deste modo a dialética não tem fim, pois é inclusive o próprio processo de percepção do indivíduo, que, para o entendimento, sempre compara uma coisa a outra.
Os outros são o nosso reflexo, assim como o nosso corpo é o espelho psicológico; a única maneira de tratarmos adequadamente do relacionamento social e das doenças orgânicas é através dessa interiorização.
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