Artigo publicado no Jornal STOP, edição 22
José Ortiz C. Neto,
Editor do Jornal STOP, jornalista, escritor e professor do Trilogy Institute e Instituto Keppe e Pacheco
Quando li A Libertação pela primeira vez, em 1980, senti uma grande paz, estando ainda na metade da obra. Recordo o dia chuvoso e o leve trovejar lá fora. De repente, tudo era pacífico, melodioso, harmonioso. Foi uma sensação inesquecível, de entrada em outra dimensão, que me mostrou o quanto sua leitura é terapêutica.
Creio que isso ocorreu porque o livro nos encoraja a ver nossos erros, pois a doença advém da conduta arrogante (teomânica) de recusar a consciência. Ao mesmo tempo, mostra a maravilha existente no universo, tanto exterior quanto interno (psicológico). A atitude humilde nos é a única benéfica, pois a realidade em si é boa (sã) bastando aceitá-la; aliás, somos nós que a estragamos com nossa conduta patológica.
Para Keppe, a pessoa adoece principalmente por ir contra o que sabe, tentando inconscientizar o que percebe. “O ser humano já nasce com sua base obnubilada, prejudicandose mais ainda ao negar, distorcer ou omitir a realidade”, escreve.
A obra nos permite, assim, descansar na verdade que um dia abandonamos, mas continua onde sempre esteve, à espera de nossa aquiescência.
Podemos observar essa prática a toda hora, por exemplo, quando negamos ter cometido algum erro, omitimos o valor de outra pessoa,ou distorcemos a verdade pondo a culpa de nossas falhas nos outros, causando-nos sérios prejuízos.
Como se diz, mentira tem pernas curta, e a verdade sempre volta e se impõe, necessitando haver uma luta constante para “apagá-la” da mente, o que, além de ser impossível provoca um enorme desgaste. Por isso, Keppe afirma: “O esforço para tornar mentira uma verdade é extremamente desgastante. A infelicidade é consequência de querer viver o que não deveria existir.”
O livro mostra que “a causa de nossa neurose é a soberba” (lembrando a frase de Cristo: “os humildes serão exaltados, e os exaltados, humilhados”).
Kraepelin dava a essa atitude que via nos doentes mentais graves o nome de megalomania (mania de grandeza). Keppe a chamou de teomania, o desejo escondido no coração de cada um de ser um deus, ou, de preferência, maior que o Criador.
“Toda fantasia sobre a própria existência é elaborada pela nossa teomania (mania de grandeza exagerada)” escreve ele, e acrescenta: “Muitos dos processos e psicoterapia incentivam a megalomania” (portanto, incentivam a doença). No entanto, “não é possível esconder toda a realidade e muito menos destruir a verdade”.
Esse processo patológico o ser humano leva para a sociedade, quando um poder qualquer faz a chamada desinformação com apoio da mídia, negando por exemplo a gravidade iminente do aquecimento global, que a poluição dos automóveis faça mal, ou tentando provar que os transgênicos são melhores que os alimentos naturais – (e sabemos o simples fato de fabricá-los demonstra a atitude enferma do ser humano de negar, alterar, e omitir o que é natural (bom, belo e verdadeiro).
O livro de Keppe é extremamente otimista, pois mostra que debaixo de toda essa patologia que tentamos criar e manter existe a sanidade, linda e brilhante (refulgente) – principalmente da vida interior, ou seja, da estrutura psicológica – bastando aceitá-la para recuperarmos, na medida do possível, a felicidade perdida.